Nova Lei da Cidadania Italiana

Nova Lei da Cidadania Italiana

Uma nova proposta de lei para limitar a transmissão da cidadania italiana Jus Sanguinis, denominada de Ius Italiae foi proposta pelo partido Forza Italia, do então Ministro das Relações Exteriores Antonio Tajani. Será que dessa vez passa? E como ela vai afetar o reconhecimento da cidadania italiana em 2025?

Essa notícia corre solta desde o dia 5 de Outubro de 2024, onde durante o evento Giornata dell’Economia em Milão, Antonio Tajani – Ministro das Relações Exteriores – famoso por suas declarações contra os italianos nascidos no exterior, em especial os ítalo-brasileiros, apresentou uma proposta para reformar a lei da cidadania italiana, a Ius Italiae

Parece que estamos presos num looping infinito, um disco que toca sempre a mesma música, não é possível que em menos de um ano já estamos aqui conversando sobre esse tema novamente. 

E pior, centenas de manchetes já anunciam o fim da cidadania italiana, empresas que dizem: corre, faça a sua cidadania imediatamente antes que acabe!!!

Parece promoção da Magazine Luiza: Só hoje, só hoje no Magazine Luiza você compra…

Só para lembrar que há pouco tempo estava em análise o tal do projeto n. 752 proposto pelo senador Roberto Menia do Fratelli d’Italia, que visava alterar a lei da cidadania nº91/1992, para:

  • Limitar a terceira geração a cidadania a “reaquisição ou reconstrução da cidadania italiana” do ascendente nascido, ou residente na Itália;
  • O requerente deveria demonstrar conhecimento da língua italiana nível B1;
  • Teria que ter um ano de residência na Itália para os descendentes de pessoas de origem italiana, além do terceiro grau, que visavam readquirir a cidadania italiana. 

Já falamos sobre esse tema no artigo: FIM DA CIDADANIA ITALIANA

Fato é que esse desenho de lei foi realmente para análise do senado em janeiro, contando com o apoio de diversos políticos italianos.

Porém, o projeto de alteração da lei da cidadania italiana do Menia é inconstitucional, como tantos outros que vieram antes dele, propostos por políticos que nem ao menos se interessam por estudar a lei da cidadania do seu próprio país e vem arrotar nacionalismo.

O cadáver nem esfriou e já temos duas novas propostas de lei. 

Aliás repare que não teve nenhuma notícia dizendo que a lei do Menia foi rejeitado, não é mesmo?! 

Na hora de alarmar são muitos a gritar, mas quando o trâmite da lei esfria ninguém fala nada. E se tem proposta de lei nova vindo aí é porque a proposta do Menia já foi pelo ralo. 

A Ius Italiae do Antonio Tajani

A Ius Italiae é um Frankenstein, uma mistura de Ius Soli, com a Ius Sanguinis e uma pitada de Ius Scholae, completa aberração jurídica.

Entenda a diferença

  • Jus Soli: A cidadania é atribuída quando a criança nasce em um determinado país. Ex. a criança nasceu no Brasil e foi registrada, essa criança é cidadã brasileira;
  • Jus Sanguinis: A cidadania é atribuída por filiação, é cidadão o filho de um outro cidadão, não importa se a criança nasceu na Itália, no Brasil ou no Japão. Ex. A criança nasceu no Brasil filha de pais italianos ou de origem italiana, portanto a criança é italiana;
  • Jus Scholae: Essa modalidade é uma proposta recente da esquerda italiana (não aprovada) que pretende atribuir a cidadania italiana a crianças estrangeiras com até 12 anos, filhas de imigrantes estrangeiros, que vivam na Itália e tenham cumprido um ciclo escolar inteiro no país (5 anos). 

Como funciona a lei da cidadania hoje?

O Código Civil Italiano de 1895 diz que é cidadão italiano o filho do cidadão italiano. A lei da cidadania italiana mudou em 1912 e 1992, mas esse trecho se manteve intacto. E quem é o cidadão italiano original? São aquelas pessoas que estavam vivas e pertenciam a alguma das regiões que foram unificadas para formar o Reino da Itália, a partir desse cidadão original, constituído junto com o Código Civil, que seus descendentes se tornaram e ainda se tornam italianos, geração após geração, nascidos ou não na Itália.

As leis que tornam a premiê italiana Giogia Meloni, ou o infame ministro Antonio Tajani italianos, são as mesmas leis que tornam  brasileiros, argentinos, venezuelanos descendentes de italiano, italianos, desde o seu nascimento.

Eu nasci em 1986, portanto a lei da cidadania italiana que vigorava no meu nascimento era a lei nº555 de 1912, portanto eu sou italiana pela lei de 1992. Minha sobrinha nascida em 2013 é italiana pela lei nº91 de 1992. Se surgir uma nova lei da cidadania italiana ela vai valer para as pessoas nascidas após a implementação da lei, pois a lei não retroage em prejuízo dos cidadãos.

O que poderia ser feito é uma lei que preveja a perda da cidadania originária para quem resida por determinado tempo no exterior, por exemplo, mas não é isso que está sendo proposto pelo ministro Antonio Tajani.

O que é a proposta de cidadania Ius Italiae? 

Esse novo projeto de lei da cidadania em 2025 é uma tentativa de corrigir alguns problemas relacionados ao projeto Menia, com uma tentativa de chegar a um acordo com a ala política esquerda que deseja a Jus Scholae, incluindo uma propina legalizada para agradar aos consulados e comuni

Joguei a lama no ventilador e agora vou explicar item a item.  

  • Problemas do projeto Menia: o maior problema do projeto Menia era acreditar que se a lei da cidadania italiana fosse alterada passaria a valer para todos os descendentes já nascidos, o problema é que o direito não funciona a assim (não retroage em prejuízo dos cidadãos), a lei só pode valer apenas para os descendentes que nascessem após a vigência da nova lei, por isso essa nova proposta de lei considerou este fato. 

Outro erro do projeto Menia, tratava de re-aquisição e reconstrução da cidadania italiana, sendo que a cidadania Jus Sanguinis é uma cidadania originária, válida tanto para quem nasce na Itália e quem nasce no exterior (Brasil, Argentina, Estados Unidos, etc.);

  • Acordo político: os partidos de esquerda na Itália já propuseram a Jus Scholae, eles lutam para conseguir implementar essa nova modalidade de cidadania para estrangeiros visando 5 anos de estudo, hoje já existe a cidadania por tempo de residência sendo 4 anos para cidadãos comunitários (pertencentes a UE) ou 10 anos para extracomunitários.

Porém, a Jus Italiae propõe conceder a cidadania italiana às crianças estrangeiras depois que completem 10 anos de estudo na Itália, podendo ser reconhecida aos 16 anos, mas dificilmente vai agradar os partidos canhotos, dado o tempo prolongado. 

  • Propina legalizada: uma das maiores críticas do próprio ministro Antonio Tajani é a mercantilização da cidadania italiana por advogados e empresas de cidadania, além dos casos de fraude de residência e subornos pagos aos oficiais. Pois bem, através da Jus Italiae será possível que os comuni cobrem até 600 euros para fazer a prática da cidadania por descendência que antes era gratuita, essa foi a forma que o Estado Italiano encontrou de legalizar a propina que muitos oficiais recebiam das assessorias. 

Além dessa cobrança descabida, os comuni também poderão cobrar até 300 euros pela emissão dos documentos dos antepassados que também era gratuito, mas que vinha sendo adotado por alguns comuni extra-oficialmente. E os consulados poderão cobrar 600 euros pela prática da cidadania italiana. 

ATUALIZAÇÃO: Com a Nova Lei Orçamentária aprovada em Janeiro de 2025, o valor da taxa consular para a Prática da Cidadania Italiana passou de 300 para 600 euros, a prática administrativa na Itália que era gratuita feita nos comuni podem cobrar até 600 euros, a prática judicial passou a cobrar 600 euros por requerente. E ainda se não bastasse essa extorsão os municípios ainda poderão cobrar até 300 euros para a pesquisa de documentos antigos.

  • A nova proposta de lei também prevê que o filho nascido no exterior em posse de outra cidadania, incluindo filhos adotivos, cujos ascendentes em linha reta de primeiro, segundo e terceiro grau sejam nascidos no exterior. Ou seja, se você reconheceu a cidadania italiana e tiver um filho no exterior após a vigência da lei, seu filho não terá direito à cidadania italiana. 

Mas, o italiano que nasceu na Itália e vive no exterior terá garantido que os seus descendentes (nascidos no exterior) serão italianos até a terceira geração.

Ou seja, essa proposta de lei divide os cidadãos entre: italianos nascidos no Brasil e italianos nascidos na Itália.  

A lei do Forza Italia será aprovada?

Se você leu o parágrafo anterior viu que provavelmente essa lei não vai agradar tanto os partidos de oposição, para quem não sabe o Forza Italia é o partido de direita, além disso dentro do próprio partido há muita discordância, muitos defendem a Jus Sanguinis frente a Jus Soli ou Jus Scholae, pois enquanto a primeira resguarda a constituição italiana e os descendentes, as outras duas defendem o direito ao voto de imigrantes que se estabeleceram na Itália nas últimas décadas e que não tem origem italiana na família. 

Não vou ficar aqui comparando quem tem mais direito à cidadania italiana, até porque eu não acredito que tem que ser um contra o outro, esse jogo quem faz são os políticos, fato é que a Itália já não produz filhos e a previsão é que até o ano de 2050  nasça o “último italiano” na península. 

Ou seja, deveria ser de interesse da comunidade italiana zelar pela manutenção da sua sociedade.

Dito isso, o que de fato é o real interesse dos administradores públicos são as cobranças de taxas para o reconhecimento da cidadania e a emissão dos documentos.

Veja, cito aqui novamente o discurso do Tajani contra o mercado da cidadania, reclamando que os descendentes latino-americanos só querem a cidadania para ir para Disney, ignorando a imensa comunidade ítalo-brasileira que vive na Itália. 

A verdade é que o próprio Tajani estimula a morosidade consular, sendo essa demora que cria o mercado da cidadania composto por assessores e advogados italianos, mas, estes políticos não estão interessados em resolver o problema ou facilitar o reconhecimento da cidadania garantido pela lei italiana, pelo contrário, criam mais barreiras para que os descendentes desistam de fazer valer o seu direito. 

  1. De um lado tem a vontade de alguns políticos e funcionários públicos de ganhar a “parte deles”, já que observam as empresas de cidadania e advogados lucrando com isso, e eles ali ganhando seu salário público, tendo mais trabalho sem ter recompensa;
  2. Do outro você tem os políticos vendo a quantidade de reconhecimentos aumentar e o medo de que esses “novos cidadãos” representem uma força política que eles não controlam. 

Temos que lembrar que a cidadania italiana também significa direito ao voto. 

Então existem interesses que convergem e que podem levar a aprovação da lei, mas por outro lado essa proposta de lei também é problemática do ponto de vista jurídico. 

Entenda que por mais que uma lei seja aprovada pelos políticos, ela precisa necessariamente ter valor legal e o problema é que na constituição italiana, diz que:

“Tutti i cittadini hanno pari dignità sociale e sono eguali davanti alla legge, senza distinzione di sesso, di razza, di lingua, di religione, di opinioni politiche, di condizioni personali e sociali.

È compito della Repubblica rimuovere gli ostacoli di ordine economico e sociale, che, limitando di fatto la libertà e l’eguaglianza dei cittadini, impediscono il pieno sviluppo della persona umana e l’effettiva partecipazione di tutti i lavoratori all’organizzazione politica, economica e sociale del Paese.”

Traduzindo: todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, sem distinção de sexo, raça, língua, religião, opinião política e de condições pessoais e sociais. 

É dever da República remover os obstáculos de ordem econômica e social que limitam de fato a liberdade e a equidade dos cidadãos, impedindo o pleno desenvolvimento da pessoa humana e a efetiva participação de todos os trabalhadores na organização política, econômica e social do País. 

Ou seja, não é possível que uma lei que trata justamente da cidadania italiana vá contra a constituição, criando cidadãos de primeira classe nascidos na Itália e cidadãos de segunda classe nascidos no exterior.

Como também não é possível que uma lei de cidadania crie barreiras econômicas com taxas abusivas para limitar a liberdade e igualdade dos cidadãos, principalmente de forma intencional para evitar o direito ao voto. – Infelizmente parece que a nova lei orçamentária criou!

Concluo dizendo que apesar dessa proposta de lei ser inconstitucional, assim como as propostas anteriores, porém nós percebemos um aumento brutal das medidas contra os descendentes latino-americanos.

ALERTA: No dia 28 de março de 2025, o Ministro Antonio Tajani, aprovou o chamado “pacote da cidadania” através de um decreto provisório que passou a valer imediatamente e duas propostas de lei, que é essencialmente o que você leu neste artigo. Tanto o decreto, quanto as propostas de lei para reformar as lei da cidadania são inconstitucionais, pois tratam a cidadania italiana Ius Sanguinis para descendentes como concessão do governo e não como cidadania originária. Porém, até que a Corte de Cassazione se manifeste, as modalidades de reconhecimento administrativas (consular e municipal) serão paralizadas por tempo indeterminado, sendo que apenas a prática do reconhecimento jurídico poderá argumentar contra essa medida utilizando a força da Constituição Italiana.

O QUE VOCÊ PODE FAZER? Caso você já tenha dado entrada na cidadania a sua análise será mantida, segundo o Ministro Tajani. Para quem está com passagens compradas, sugiro que se puder cancele e adie seus planos, se não puder contrate um advogado para te representar na Itália e não caia nos papos das assessorias, pois no momento as assessorias serão como uma pessoa se afogando, elas vão fazer de tudo para se manter (afinal é o ganha pão delas), mas se você quiser ajudar pode se afogar junto, por isso garanta assessoria jurídica. E para quem estava apenas traçando planos de reconhecer a cidadania italiana, pelo menos agora será só pela via judicial.

No mais, eu sugiro sempre que você conheça a fundo o seu direito a cidadania e faça você mesmo a pesquisa  e o preparo dos documentos para evitar fraudes, para isso você tem o nosso curso: ORIGEM ITALIANA

Até porque conhecimento é poder! E aqui no ITALINHA vamos continuar informando e batalhando para que mais brasileiros reconheçam a sua origem italiana e que um dia esses milhões de ítalo-brasileiros possam ser uma força política contra quaisquer políticos (de direita ou esquerda) que sejam desrespeitosos com a memória dos nossos antepassados.

Assim como vamos continuar estimulando o interesse pela cultura italiana e o amor pela Itália, pois acreditamos que os bons italianos não podem pagar por quem só quer o passaporte para ir a Disney, mesmo que isso seja anti-ético, mas ainda sim plenamente legal. 

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